quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Singeleza

Existem poucos lugares em que eu me sinto completamente bem não importa em que ponto da estrada eu esteja, nem penso em você. A livraria é um deles.

Estou para comprar Paris é uma Festa, do Hemingway. Li as primeiras páginas e estou apaixonada por ele. Mas é caro pra um livro que eu vou terminar de ler em um dia... Queria levar mesmo é Por Quem os Sinos Dobram, mas não tenho dinheiro pra ele, não trouxe. Ele é mais grosso, pelo menos.

Se bem que eu estou curtindo as edições bilíngues. Se o livro não é bom, eu estudo. E mesmo finos eu passo mais tempo com eles. Mas até agora eu só achei Emma, da Jane Austen, e eu num estou nem um pouquinho motivada para ler Jane Austen. Além do mais, particularmente eu não gosto de livros com nome de mulher, assim como não gosto de cachorros com nome de gente.

Queria achar um em francês bem difícil, mas não acho. E nem vou perguntar. Não gosto de perguntar por livros quando não vou para comprar especificamente um. Se eu não achar, num era pra ler...

Vou acabar levando O Tempo entre Costuras, da María Dueñas, mesmo. Faz dias que eu estou para ler esse. Gostei do nome... E de que a primeira frase dele seja "uma máquina de escrever detonou o meu destino". Queria uma máquina de escrever... Vou pegar esse que está por aqui mesmo. Gosto da perspectiva de que várias pessoas passaram as mãos por ele e por algum motivo não o levaram pra casa, numa cumplicidade doída de se assumir.

Queria mesmo uma máquina de escrever.

...


Queria você.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Me questiono

Nossa perfectibilidade é uma das características que nos diferencia dos animais.
Além da consciência da morte, que deveria ser mais como uma urgência da vida, mas tudo bem, seria mais uma forma de nos enganarmos. Que as coisas que nos pareceriam urgentes, nela, nos seriam como lixo, uma hora. E num é? Confessem. Sem exageros ou licença poética. Lixo mesmo. Que a terra podia muito bem engolir, imediatamente. E se ainda não é, há de ser.
Nossa perfectibilidade é isso. É o que garante a não insubstituibilidade (e se nem existir essa palavra, foda-se. Só ela pode dizer o que eu quero dizer) de qualquer coisa no mundo. Tudo vira esse lixo. Não adianta.
Tudo.


Nossa perfectibilidade é uma das características que nos diferencia dos animais.
Então por que é que me canso de nos ver revirando o lixo como um deles?

Puta que pariu.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Pra você guardei o amor

Ela era tão linda, tão deliciosamente linda, que eu nem ligava chegar em casa e vê-la andando nua num apartamento de cortinas abertas. Silenciosamente, ia até lá e as fechava, enquanto ela abria o seu sorriso pra mim. Não que ela tivese um desejo interno de grandioso exibicionismo. Gostava de luz, gostava de nudez, e para ela as coisas funcionavam simples assim. Não se importava com absolutamente ningúém. E disso quem gostava era eu.

Me realizei ao vê-la lidando gentilmente bem com os ataques da minha mãe ao seu jeito de ser, vestir, falar, comer, e ser novamente, exatamente nessa ordem, quando se conheceram. Eu lhe avisei que isso aconteceria, que ela se incomodaria com nosso relacionamento e todo mundo iria falar e comentar sem parar aquele dia, e os que viriam também. Minha família nasceu, cresceu e provavelmente vai se extinguir sem saber admirar a exceção. Ela simplesmente não sabe lidar com o prato diferente que substitui o que quebrou, na mesa posta, sabe? Não sabe lidar com a realeza da minha menina no reinado de mulheres sem graça da família. Mas era como se eu nem precisasse avisar...

Chego e a arranco de onde quer que esteja, a trago para colar em mim, pelo quadril, lhe declaro e dedico poemas (um novo a cada dia) ao pé do ouvido, porque sei que ela gosta e morre de rir e de amor. Ah, e descobri, recentemente, que não são os mais eróticos que terminam minhas chegadas em uma entrega de amor mais louca, e sim os mais tristes.

- É que tenho tanto dó da tristeza...

Confessou-me quando perguntei sobre esses poemas, dias desses, depois de lhe imitar um solitário trovador, deitado em seu colo - meu palco mais cheiroso e gostoso e inspirador do mundo.

- ... e preciso mostrar que existe saída. O amor existe, sabia?


Se sabia, era por causa exclusiva dela.
E se era saída?

Bom... Foi a minha.


Pra você guardei o amor.