sábado, 23 de outubro de 2010

Outono

Em São Paulo, depois de (quase) um ano totalmente alheia e distante, por culpa e consequência de uma necessidade criada em momento inoportuno, dentre outras coisas tão complicadas que só eu estou acostumada - e teimo em achar que os outros também estão, e já não quero mais estar -, numa noite muito menininha como há muito tempo não tinha - e nem sentia -, resolvemos ler novamente todos os posts e comentários do final de 2008 de todos os jornots que os escreveram. É meio engraçado, irônico e incômodo. Hoje, aqui comigo, 24h por dia desde o dia em que eu cheguei, tenho a única jornot que mandou um post sofrido, duro, sincero.. e de verdadeiro ódio à ECA. Aquele ano pra ela definitivamente não foi o mesmo pra mim ou para os outros. Eu não fui pra ela o que devo ter sido pro restante, nem o que o restante foi pra mim o foi pra ela. Mas está sendo aquela que recolhe, eficientemente (se é que dá pra falar em eficiência quando se fala em saudade), essas saudades de hoje dessa ex-jornot 08... Talvez tão doídas, duras e sinceras como tenha sido aquele ano pra ela, e eu não estive presente, sequer ciente disso, na época. E é claro que tem comigo também a amiga de sempre. Constante, de cotidiano a e-mails de saudade, de falhas e amores tão humanos que me conquistaram eternamente. E eu, a mesma... só que completamente diferente! :)
Os outros posts foram todos de amor derramado.
E os comentários mal podiam esperar pelo que estava por vir. O negócio é que o que estava por vir... veio.
Não vou dizer que nos iludimos ou superestimamos o futuro. Porque, sim, eu sei que os CAJUS diminuíram, as brigas surgiram, e aumentaram, as divisões, finalmente, apareceram e, enfim, as pessoas miaram. Ou simplesmente cresceram... Mas era natural que pensássemos no futuro daquele jeito. Atípico seria se tivéssemos pensado como se fosse vida... Era surreal demais para simplesmente ter o mesmo destino de todas as outras coisas, sabe? Mas, no fundo, era só realidade. E ainda bem! Porque permitiu que as lembranças não passassem pela amnésia natural dos sonhos, com o passar dos dias.
Não digo que pudéssemos corresponder a essa eufórica expectativa. Muita coisa, talvez, tenha tomado o rumo certo: os casais deixaram tudo mais sossegado, é verdade, mas ainda são belos casais... devia estar escrito. Mas eu também sei que muita coisa podia ter sido diferente. Foram reescritas à minha maneira, nem sempre muito inteligente, mas sempre muito visceral.

Não me lamento, me arrependo ou reclamo de nada. Não me permito. Mas também não me permito fingir que não me doem as expectativas assim, como flores pisoteadas...

sábado, 9 de outubro de 2010

Confissões de um menino perdido

Bea me acordou cedo domingo. Sonhei que ela estava se afogando e não consegui mais dormir. Passei anos da minha vida brincando dias inteiros, no rio, com uma Bea pequena e destemida, que caçava borboletas coloridas e pegava girinos com as mãozinhas em concha. Mas de uns tempos pra cá, ela passou a dizer por aí que tem medo de morrer afogada. Minha mãe diz que bobagem, Bea deve ter sonhado que se afogou e traumatizou. Mas eu tenho certeza de que ela só começou a dizer isso pra imitar a Natalie Wood. Sabe, antes de perceber isso eu nunca tinha pensado em como deve ser difícil crescer mulher por aqui. Não se tem exemplos, muito menos espaço... Bea quer medos poéticos de destinos bonitos, por isso rouba umas vidas que não são dela. Nem das senhoras sem graça alguma que nascem e morrem por aqui, sem deixar nada. Eu gosto. Quando ela diz coisas que pensa serem sofisticadas, revela outras nunca dantes percebidas, desenha gestos diferenciados, eu fico tentando imaginar em quem ela está imitando, que filme está rodando na cabecinha dela. Por isso eu sei que quando diz aquelas coisas ela só está imitando a Natalie Wood... Bea quer ser mulher em toda sua essência, como nunca vai ser possível aqui, eu acho. Já eu quero brincar no rio, ainda. Rio que ela não vai mais por causa desse pseudo medo de um destino roubado. Bea cresceu. Antes de mim. E isso me doeu muito! Esses dias, ela me disse que ficava apaixonada por mim quando via que eu estava com alguma roupa descombinada, apesar do meu esforço em combiná-la bem. Eu, como todo menino bobo, fiquei mais bobo ainda, achando que ela estava falando sério. Riu de mim. Eu não disse que tinha entendido assim, claro, mas mulher lê essas coisas no olho da gente. Na verdade, eu acho que elas só dizem essas coisas pra ver o poder que tem sobre nós estampado no olho da gente. Bea não é uma paixão, nem eu sou uma dela. Mas é que ela tem, sim, poder sobre mim como toda mulher que a gente deixa tomar conhecimento de nossa suficiência dela. E esse poder é a única coisa desenvolvida em todo seu potencial de mulher que nunca muda, em lugar nenhum, nem aqui! Por isso tenho a impressão de que Bea vai abusar bastante dele... como uma déspota desesperada, rainha... ora imagem de uma moleca descalça, nas minhas lembranças, ora de uma mocinha de cinema, no meu coração, já vem abusando do poder de me acordar e não me deixar mais dormir, de vez em quando.
Vai que de vez me encanto...
... de vez me encanto com as perninhas finas dela.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Ficar com você foi como olhar minha vida do lado de fora.
Não que eu não estivesse presente, mas era como se, ao mesmo tempo, eu me assistisse. Contrariando toda regra da física, de repente era possível que eu estivesse em dois lugares ao mesmo tempo, desde que não contrariasse qualquer outra regra... Minha. Essas não são muitas, nem tão complexas. No geral, me privam de grandes aborrecimentos e, também, amores. Por causa delas nunca assumi riscos. Nunca me permiti errar de corpo e alma, estando sempre, de uma certa forma, em cima do muro. Nunca inteira, ou de um lado, ou de outro. Tem uma historinha maniqueísta na qual Deus chama aquele que está em cima do muro para o lado dele, enquanto o Diabo fica quietinho no seu. Até que a pessoa, intrigada, pergunta: pô, Diabo, você num vai nem tentar me chamar pro seu lado? E o Diabo responde: num preciso, enquanto você estiver aí, você já está.

Por isso eu acho que devo ter assistido minha vida com você! Porque tinha eu, essa minha parte de mãos dadas com o Diabo, me equilibrando para não cair de vez pro seu lado, mal sabendo que já estava em um deles, e tinha eu com você. Como filme, como minha vida deveria ser: uma estrada sem fim e em boa companhia ao som de Norah Jones.