quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Menina

Eu não desenhei você, menina. Primeiro que se eu tivesse parado e desenhado você, menina, você teria um belo par de olhos azuis. Pra não dizer outras coisas que vem em pares... Ah, e você não reprovaria esse meu comentário. Fato é que você teria, sim, sem sombra de dúvidas, uns olhões assim de dar gosto, menina!
Sequer poderia pensar eu que o retrato mais bonito que faria de você seria um com os olhos fechados. E mais... Sequer poderia pensar eu que esses olhos fechados seriam minha companhia em todos os momentos mais prazerosos da minha vida, simplesmente por indicarem os momentos mais prazeroros da sua...
Depois que eu nunca pensaria em como desenhar seu narizinho. Passaria reto e cego por ele. E só hoje eu sei como acho gracioso o seu narizinho. Cheio de pintinhas que aumentam com o sol, franzido quando voce ri, torcido quando me desaprova. A coisa mais linda desse mundo. Desde o primeiro beijinho de esquimó. Essa coisa brega que você insistia em fazer toda vez que me via mal-humorado. Eu ria.
Também não te faria tão alta e desengonçada, menina. Você é tão desproporcional... Tão. Que me encanta profundamente. Quase que me emociona. Te ver chegar ou ir, sempre deselegante, meio menina, meio moleque, quase nada mulher.
Você não seria tão exibida, também. “Olhem para mim, como eu sou atraente, como eu canto bem, como eu sou engraçada, blá, blá, blá.” Mas isso eu sei que é puro ciúme. E me quebra vez’emquando, mesmo sabendo que é besteira.
No fundo, creio que não te faria mais bonita. Você não é a mulher mais bonita que eu já vi nesse mundo. Mas tem uma beleza assim que não enjoa a gente, sabe. Que não afasta a gente, nem inibe. Só convida. E nem sempre recebe.
Você seria flamenguista e faria medicina. Não teria dores de cabeça ao prender o cabelo e nem derreteria o sorvete para tomar porque “assim é mais gostoso”. Você saberia menos de carros. Na verdade, você simplesmente só dirigiria pior do que eu e, às vezes, só às vezes, me pediria pra fazer uma baliza difícil.
Mas não fui eu que te desenhei, menina. E eu agradeço todos os dias por isso. Agradeço a Deus, ou o que quer que erroneamente chamamos de Deus, por não ter desenhado você. Ou talvez, ainda agradeça a Ele por ter parado e desenhado. Como eu ia criar uma coisinha assim como você?
Que anda em câmera lenta?
Não. Não é que eu ouça música, sinos ou veja estrelas quando te vejo.
Nem tudo para. Aliás, tudo continua.
Mas é que você mexe comigo em câmera lenta, sabe?
Deve ser quando eu bebo demais.
Ou de menos – e aí que a necessidade de te esquecer vem forte e tudo em você parece ter que demorar mais pra ficar mais tempo comigo. Talvez se você fosse de minha autoria não tivesse que ir embora e me obrigar a te banir dos pensamentos.
Mas, sem hipocrisia, mil vezes a tua liberdade de mim do que a mísera possibilidade de eu te criar menos menina. Essa menina que quando eu disse “me abraça” em francês, bêbado, no meio da rua, me abraçou segura. E eu achei lindo! E te amei mais que tudo.
Minha menina.
Mil vezes a tua liberdade que a tua desnatureza.
Linda.
Selvagem.
Rainha.

Sozinha.