sábado, 9 de outubro de 2010

Confissões de um menino perdido

Bea me acordou cedo domingo. Sonhei que ela estava se afogando e não consegui mais dormir. Passei anos da minha vida brincando dias inteiros, no rio, com uma Bea pequena e destemida, que caçava borboletas coloridas e pegava girinos com as mãozinhas em concha. Mas de uns tempos pra cá, ela passou a dizer por aí que tem medo de morrer afogada. Minha mãe diz que bobagem, Bea deve ter sonhado que se afogou e traumatizou. Mas eu tenho certeza de que ela só começou a dizer isso pra imitar a Natalie Wood. Sabe, antes de perceber isso eu nunca tinha pensado em como deve ser difícil crescer mulher por aqui. Não se tem exemplos, muito menos espaço... Bea quer medos poéticos de destinos bonitos, por isso rouba umas vidas que não são dela. Nem das senhoras sem graça alguma que nascem e morrem por aqui, sem deixar nada. Eu gosto. Quando ela diz coisas que pensa serem sofisticadas, revela outras nunca dantes percebidas, desenha gestos diferenciados, eu fico tentando imaginar em quem ela está imitando, que filme está rodando na cabecinha dela. Por isso eu sei que quando diz aquelas coisas ela só está imitando a Natalie Wood... Bea quer ser mulher em toda sua essência, como nunca vai ser possível aqui, eu acho. Já eu quero brincar no rio, ainda. Rio que ela não vai mais por causa desse pseudo medo de um destino roubado. Bea cresceu. Antes de mim. E isso me doeu muito! Esses dias, ela me disse que ficava apaixonada por mim quando via que eu estava com alguma roupa descombinada, apesar do meu esforço em combiná-la bem. Eu, como todo menino bobo, fiquei mais bobo ainda, achando que ela estava falando sério. Riu de mim. Eu não disse que tinha entendido assim, claro, mas mulher lê essas coisas no olho da gente. Na verdade, eu acho que elas só dizem essas coisas pra ver o poder que tem sobre nós estampado no olho da gente. Bea não é uma paixão, nem eu sou uma dela. Mas é que ela tem, sim, poder sobre mim como toda mulher que a gente deixa tomar conhecimento de nossa suficiência dela. E esse poder é a única coisa desenvolvida em todo seu potencial de mulher que nunca muda, em lugar nenhum, nem aqui! Por isso tenho a impressão de que Bea vai abusar bastante dele... como uma déspota desesperada, rainha... ora imagem de uma moleca descalça, nas minhas lembranças, ora de uma mocinha de cinema, no meu coração, já vem abusando do poder de me acordar e não me deixar mais dormir, de vez em quando.
Vai que de vez me encanto...
... de vez me encanto com as perninhas finas dela.

Um comentário:

Alice Agnelli disse...

e depois era vc que não tinha inspiração..