sexta-feira, 8 de abril de 2011

Amor em 3 atos : Primeiro.

Não estou raciocinando muito bem quando decido ir falar com você. Decido? Eu disse decido? Não foi bem uma decisão. Foi mais um impulso. Tudo bem, fui egoísta de novo. Mas foi por amor, dessa vez (vale?). Sei que devia ter cortado toda e qualquer oportunidade de me relacionar com você, antes de qualquer coisa. Mas essa não sou eu. Eu não fecho as portas por onde passo nem as da onde estou. Deixo-as no máximo encostadas. Quem quiser entrar que entre, do passado ou do futuro, faça-me o favor. Sente-se para uma xícara de café, vamos conversar.


Eu não te fiz tão mal. E acho que você não ficaria de todo incomodado em ouvir minha voz de novo. Ficaria, até posso supor, feliz. Ficaria? Sei que tive tempo de sobra pra pensar nessas coisas – e realmente pensei! – mas não consegui me convencer delas, então não é agora que já falei, e porque falei, que isso vá acontecer, né.

Bati. Eu sei que você não é como eu. Que suas portas se fecham sempre que saem as pessoas por ela. Bati com força, então. Já não estava raciocinando mesmo. Não me importava se estivesse fingindo não estar, no momento, ou se estivesse com outra pessoa e eu corria o risco de acordar a casa toda.

Você abriu.

Era 400 vezes mais bonito do que eu me lembrava. Sempre que quero aumentar alguma coisa, como os quilos que eu engordei nos feriados, os minutos em que eu fiquei na fila do supermercado, eu uso o número 400.

Depende do referencial.

No meu, é sempre um número bem grande.

Fez cara de que estava entendendo tudo, e não estava entendendo nada. Agiu seguro, contundente, controlado. Tudo que não costumava ser na minha presença. Sorriu gostoso. Mais de incredulidade do que de satisfação. Eu quis ir embora na hora, mas sei que seria ridículo. Mais ridículo do que ter aparecido, seria ter ido embora! Por isso, e só por isso, eu fiquei. Contra a minha vontade de chorar, que se você não me oferece algo, eu já ia logo satisfazendo.

Daí, fui obrigada a falar que num queria nada, obrigada. E a controlar um choro engasgado, engatado já.

- Você não existe.

Quem dera não existir naquele momento mesmo. Onde eu estava com a cabeça? Ah, já sei... Eu não estava raciocinando muito bem, né? Mas... Justifica?

Ir até ali havia sido impulso. E agora? Minha declaração de amor ia sair do mesmo jeito, impulsionada por um impasse doído? Ou amor não saia espremendo assim?

Que droga. Tinha muito pouco tempo pra pensar em alguma coisa, enquanto tive uns bons anos e meio pra fazê-la, de fato – e nada fiz.

Bom, mas antes de eu chegar até aqui, algumas coisas aconteceram. Eu viajei por todos os continentes, aprendi a cozinhar, a fumar sem tossir, dança de salao, fiquei fluente em três línguas, e cortei o cabelo umas 400 vezes.

Tudo isso pra esquecer você, num primeiro momento, e depois, pra te reconquistar. Confesso que fui mudando essa ordem, especialmente quando percebi que não tinha nascido pra cozinha e de tentativa de ser uma mulher mais interessante pra voce, ela passou a ser apenas um passatempo pra te deixar ir.

A ordem parou em voce quando eu parei de me negar. E ai eu parei.

Aqui.

Eu sei que te conheci quando menina. Só de o tempo ter passado eu já era com certeza uma mulher mais interessante. Ou, no mínimo, uma mulher. Mas eu queria ser uma mais bonita, mais inteligente, mais viajada e mais experiente. Eu queria ser uma mais que todas as outras que ocuparam meu lugar nesse tempo todo, juntas.

E, olha, eu fui.

Eu, olha, eu sou.

Sei lá.

Agora te olhando assim sem saber o que falar me faz questionar por que eu rodei tanto o mundo pra voltar pro mesmo lugar. Ou por que todas as coisas que eu faço são pelos outros e nunca simplesmente por mim. Não podia querer ser uma mulher melhor pra mim?

Não...

Do mesmo jeito que eu nasci sem muitos dotes culinários, eu nasci com muita dependência de ser para alguém. Nesse caso, há muito tempo, e sem mesmo que você desconfiasse, para você.

Eu sei, eu odeio e você também, esse discurso de “nasci assim, não posso mudar”. Mas isso é como que um talento. Ou mais uma falta dele. E outra que sou feliz assim!

Não me sentia feliz naquele momento, mas tudo bem. Eu era.

Era, sim.

(...)

3 comentários:

Camila disse...

Meu deeeeeeus, Paulinha! Socooorro, me identifico tanto..
que texto maravilhoso! louca pra ler o segundo ato.
Beijo!

Samantha disse...

Oiii...adorei teus textos....
Vou acompanhar...
Se quiser passa no meu blog: quasegrande.blogspot.com

Léa disse...

Adorei esse texto também...duvido que muitas pessoas não se identificam tanto ali! Confesso que chega uma hora na vida que vc faz por vc mesma, certeza! beijo!